Temporada de ‘A Madrinha Embriagada’ acaba com sensação de dever cumprido entre atores
Para garantir ingressos na última apresentação, 10 pessoas passaram a madrugada na fila de espera
Após mais de 11 meses em cartaz, o espetáculo “A Madrinha Embriagada” chegou ao fim na noite deste domingo (29/06) no Teatro do Serviço Social da Indústria de São Paulo (Sesi-SP). Para os atores, prevaleceram as sensações de dever cumprido, honra e um pouco de tristeza pelo fim da temporada. Já o púbico deve levar na memória não só as músicas preferidas, mas novas amizades.“A gente se matou de fazer apresentações: oito por semana, uma maratona. Vocês não têm ideia do quão cansativo é. Mas eu faria tudo isso de novo com o maior prazer e honra”, contou Saulo Vasconcelos, que interpreta o produtor Iglesias no espetáculo, menos de uma hora antes de começar sua última apresentação.
Para Vasconcelos, a escolha pelo espetáculo foi um “tiro certo” para iniciar o Projeto Sesi-SP de Teatro Musical e “coube perfeitamente para a proposta de ingresso gratuito”.“Esse público é formado por uma maioria que não tem condição de pagar de 170 a 250 reais, que é a média de preço que se cobra. E é justificável esse preço absurdo porque são produções caríssimas e um investimento que precisa ser retornado. Mas esse público que vem aqui é basicamente constituído por essas pessoas e a relação delas é a mais sincera, mais divertida possível. A sensação é de dever cumprido, de vitória”, disse o ator que já protagonizou espetáculos como “O Fantasma da Ópera”.
O ator Cleto Baccic, que interpreta o argentino Adolpho em “A Madrinha Embriagada”, contou que sua maior recordação dessa temporada é o retorno do público.“Não tenho palavras para agradecer ao Sesi-SP e a Fiesp [Federação das Indústrias do Estado de São Paulo] por apoiar o teatro brasileiro e não só pela minha classe, mas por todas essas pessoas aqui. Tem gente que nunca teve oportunidade de assistir a um espetáculo de teatro e, no entanto, eles estão aqui graças a esse investimento”, disse um Baccic emocionado minutos depois de tirar fotos com os espectadores. “Eu faço questão de ter esse contato, de acabar o espetáculo e conversar com as pessoas. E superou nossas expectativas e as do Sesi-SP também”, completou.
A Madrinha’ mais de 50 vezes
Do lado da plateia, há pessoas que assistiram a um musical pela primeira vez e gostaram tanto que repetiram dezenas de vezes. É o caso da autônoma Ingride Alves Bens, de 47 anos, que na última apresentação assistiu a “A Madrinha Embriagada” pela 51ª vez.
“Cheguei aqui às 22h de ontem para ficar para o dia seguinte. Fiquei de pé até as 9h de hoje quando liberaram a portaria para a gente poder sentar um pouco”, contou Ingride, que optou por ficar em pé durante toda a noite. “Para não amassar minha roupa”, explicou.
Ela passou a noite no portão do Teatro do Sesi-SP com mais nove pessoas. Uma delas é o filho Marcio William Bens, de 18 anos, e os outros oito são amigos que ela e o filho fizeram após enfrentarem as filas para pegar ingresso ao longo das mais de 50 vezes que assistiram ao musical.
“A gente pegou papelão, colocou na beira do portão do lado de fora e enquanto uns dormiam encolhidinhos, os outros ficavam tomando conta. A gente forma uma família”, disse Ingride em sua noite de despedida do espetáculo. “Agora não sei o que vou fazer para substituir esses dias que tenho vindo para cá.”
O professor de inglês, Vinícius Guimarães, assistiu ao Madrinha mais de 40 vezes “porque não tem outro musical como esse, o nível do espetáculo e dos atores é muito alto, o que é muito difícil de encontrar de graça”, defendeu. Ele fez amizade com Ingride e disse que é uma coisa que acaba acontecendo com muitas pessoas “porque a gente fica nas filas, esperando cinco horas para ter ingresso”.O confeitador Leandro Sena, de 19 anos, também engrossa o couro dos quarentões em sessões doe “A Madrinha”. Ele garantiu que repete tantas vezes o mesmo musical porque “nunca é a mesma coisa, mas nem que seja um fio de cabelo que cai no chão diferente, a gente percebe”.
Outro atrativo para voltar dezenas de vezes ao teatro é o elenco. “Os atores são muito simpáticos.”Sem ostentar tantas sessões, a psicóloga e atriz Lígia Lage, 31 anos, e o designer João Mendonça, 32, aguardavam na numerosa fila para entrar no Teatro do Sesi-SP e assistir pela primeira vez ao espetáculo. “Eu já tinha desistido, mas através de um amigo acabamos conseguindo de última hora”, contou Lígia. Para ela, é fantástico o Sesi-SP distribuir ingressos de graça para musicais como “A Madrinha” .
“Porque o povo brasileiro precisa de entretenimento com cultura de verdade.”
A expectativa de Mendonça era de assistir a uma peça “bastante divertida”. Apesar de a temporada durar mais de 11 meses, ele pediu: “poderia ser mais longa”.
Novo musical
Veterana em musicais protagonizando espetáculos como “O Fantasma da Ópera” e “Les Misérables”, a atriz Sara Sarres resumiu a noite: “muita emoção. Sentimento de gratidão enorme e de orgulho por ter feito parte desse projeto que trouxe mais de 150 mil ingressos gratuitos. “Estou triste por uma temporada que está se encerrando, mas feliz por esse lindo começo para a cultura.” Ela se referiu ao Projeto Sesi-SP de Teatro Musical, que, além de formar atores para o mercado desse gênero artístico, também vai oferecer mais um espetáculo de graça a partir de setembro, a montagem de “O Homem de La Mancha”, musical baseado na obra de Miguel de Cervantes com direção de Miguel Falabella. Para Cleto Baccic, o novo espetáculo tem um significado especial. “O sonho impossível continua ser possível de ser realizado aqui no Sesi-SP.”